7.8 Uma questão de inspetores, fichas de avaliação e planificação

ciclo 1º Ciclo
id Gabriela-8
pof entrevista_Gabriela
keys inspeção // família // dificuldades sentidas // planificação
nvivo incidentes críticos
geo aldeia de Aguiar da Beira

Outra história, também dos inspetores: estava aqui numa aldeia de Aguiar da Beira, também tinha as quatro classes e nessa altura eu levava o D. - talvez tivesse uns quatro anitos - e tinha, se calhar, sete ou oito alunos, mas das quatro classes. E então, havia lá uma senhora, uma senhora já velhota, que tinha a cargo dela os dois netos, os pais estavam para a Suiça, então deixaram os dois netos à avó e andava um lá na escola e o outro era da idade do meu filho, era o A.. E então a senhora perguntou-me se eu o podia deixar ir para a escola também. Porque ela precisava de ir para o campo, precisava de ir às compras. E perguntou se eu o deixava ir, eu disse “olhe, não pode vir todos os dias, não é? Portanto, não é menino da escola. Mas como também cá tenho o meu filho, deixe-o vir, até brincam ali no pátio, outras vezes dou um desenho para pintarem, pronto”. Porque tinha lá o irmão e a senhora queria muito fazer trabalho do campo e não podia por causa do menino, que tinha quatro anitos como o meu filho. E, portanto, lá estavam eles a fazer um desenho, nisto chega o inspetor. Eu vejo o inspetor, o Inspetor P., também um inspetor que era assim um bocadinho rigoroso… E os outros meninos estavam a fazer fichas de avaliação. Aquilo que eu nem devia ter feito, lembro-me muito bem, porque eu tinha agrafado a ficha de Língua Portuguesa, de Estudo do Meio e de Matemática que era para irem fazendo. Por exemplo, hoje faziam a de Português, mas já estava a de Matemática atrás e a de Estudo do Meio. E não devia ser não é? Não devia ser porque se estavam a fazer Português, não deviam ver o que estava para a frente já. E então era o quarto ano estava a fazer essas fichas. Eu vejo chegar o carro do inspetor e de repente soltei as fichas - eram só dois ou três no quarto ano - soltei as fichas e meti-as na gaveta! E eles estavam a fazer Língua Portuguesa. Depois veio lá o inspetor e estavam os outros dois miúdos ali - o meu filho e o outro - a fazerem desenhos. Eu não sabia se ele aceitava isso, mas pronto, estavam! Também não podia pô-los fora. Muito fiz eu ao separar as fichas (risos). Ele dirigiu-se à escola e quando eu fui abrir a porta - claro, com todo o à vontade “senhor inspetor, seja bem vindo à nossa sala. Apresento-lhe a minha turma, é uma turma assim e assim” - e ele esteve um bocadito e depois disse “então e estes meninos?”. E eu “olhe senhor inspetor, este é meu filho. E este menino de vez em quando” - eram mais as vezes que ia, mas pronto - “como tem aqui um mano e os pais estão para a Suíça, de vez em quando vem”. E ele “muito bem, muito bem, professora! Muito bem, muito bem. Estão a fazer um desenhinho?”, depois lá perguntou ao D. “então o que estás a fazer?”, portanto não se zangou, não disse nada! Pronto, mas esteve comigo, eles pediam as planificações, tínhamos que ter as planificações anuais, mensais, semanais e até diárias. Às vezes a gente não fazia tudo, não é? Porque era muita trapalhada, muita escrita, levava muito tempo para aquilo que a gente devia ensinar. Mas ele pediu as planificações e viu que realmente as tinha feito. E ele fez-me assim “então olhe, deixe-me ver esta planificação”, era do mês anterior e depois pediu-me um dossier, o caderno diário dos miúdos quando eles estavam a escrever. E foi ver - lembro-me perfeitamente - foi ver se coincidia o que eu tinha posto na planificação com o que realmente tínhamos feito. Olhe veja bem, este era isso. Não interessava muito a entrada ou saída certa, mas interessava-lhe se realmente nós tínhamos feito aquilo que estava na planificação. E a gente fazia quase sempre. No entanto, era difícil porque a gente tinha de fazer as planificações e tinha que fazer com que coincidisse mesmo. Por exemplo, dizíamos “leitura do texto da Andorinha”, e depois tínhamos de fazer o texto, fazer o ditado, as palavras difíceis, a divisão silábica. E ele quis saber se coincidia. Portanto, esse inspetor era mais rigoroso nesse aspeto, enquanto o outro não pediu assim nada de especial. Pronto, esta questão dos inspetores, fui visitada algumas vezes por eles, mas também não criaram problema nenhum. Nem eu a eles, porque eu também os punha à vontade e falava com eles acerca das dificuldades que sentíamos e viam que era sincera. Também nunca tive problemas com eles.