| ciclo | Pré_Escolar |
| id | Tânia-3 |
| pof | entrevista_Tânia |
| keys | ajuda // cuidado // solidariedade social |
| nvivo | incidentes críticos |
| geo | Lisboa |
Hoje eu já não faria isso, nem recomendaria a ninguém que fizesse. Portanto, são momentos que marcam muito. Eu sabia que aquelas mães estavam em casa a dormir e os meninos estavam por lá e que elas não os levavam à BQJB. Eu combinava com as minhas colegas - algumas faziam isto mas eu era a mais arrojada - e ia lá bater à porta e dizia às mães: “Está ai a R.? Está ai a M.? Já tomou o pequeno almoço? Já está vestida?” Às vezes era só assim, de porta. Eu sabia que ela tinha estado toda a noite a prostituir-se. Eu quando falo nisto comovo-me muito. Eu sabia que era a única forma de eu poder participar em momentos mais felizes daquelas crianças, senão elas ficavam todo o dia e as mães a dormirem. Isto não aconteceu uma vez, nem duas, nem três, nem quatro. Aconteceram várias vezes. Também fazia outra coisa: a etnia cigana vendia numa grande praça, na Ajuda. Eles tinham os meninos lá, que eram os meus. Eles não tinham tido tempo de os ir deixar à BQJB. Eu fazia a recolha dos meninos também. Eu ia buscar uns e depois ia a outra rua - nós chamavamos Rua da P. - eu sabia onde é que eles estavam, porque eu sabia onde é que os pais estavam a vender. Eu perguntava [aos pais]: “Ele pode vir?” Eles têm assim algumas conceções muito próprias. Umas vezes diziam que sim, outras vezes diziam que não. A maioria das vezes diziam que sim. Os meninos também queriam ir, embora os meninos já gostassem muito de estar a vender com os pais. Era engraçado. Fosse roupa, fosse fruta, fosse pratos, panelas, eles gostavam muito de vender. Mas eu também sabia que era importante que eles fossem [à escola]. E, portanto, eu dizia: “Olhe, eu passei por aqui! Quer que eu os leve?” Lá ia eu. Ora, hoje, isso já não se pode fazer. Isto foram momentos muito, muito marcantes. Tenho muitos momentos assim, que foram fundamentais no meu percurso.