| ciclo | 2º Ciclo |
| id | Fátima-2 |
| pof | entrevista_Fátima |
E depois, como estávamos perto de Peniche, claro, quando queríamos dar uma voltinha num fim-de-semana que não vínhamos, íamos até Peniche. Curiosamente, lá, juntamos um grupo de funcionários públicos que iam para a ponta do distrito, portanto, o distrito de Leiria, Peniche era a ponta. Então, eram funcionários da Câmara, das Finanças, professores, e lá nos juntávamos todos na esplanada, no Verão. Uma vez fomos às Berlengas…mas também me lembro de que, de vez em quando, estávamos na conversa e, quando alguém tinha algum descuido, em termos de que podia ser politizado, alguém dizia “Atenção! Cuidado!”, porque havia lá uma sede da PIDE. E havia a prisão do Forte de Peniche. E então, aquela zona do Forte era sempre complicada. E tenho memória de duas coisas de que nunca mais me esqueci: uma delas foi um Domingo em que eu e a colega fomos a Peniche arejar um bocadinho, penso que fomos à missa, salvo erro, e depois já era assim tarde, tínhamos um autocarro já assim à noitinha, mas como ainda não eram horas do autocarro, fomos dar uma volta à beira-mar e passámos pelo forte. E às tantas começámos a sentir dois homens atrás de nós. Eram polícias, não sei se eles iam fardados se não, não me recordo. Mas talvez sim, nós identificámo-los como polícias, eram da PIDE. E então nós mudávamos de passeio, eles mudavam de passeio; nós mudávamos de rua, eles mudavam de rua…e começamos a pensar: estamos a ser seguidas. Duas meninas, duas jovens, aqui, na zona do Forte, a esta hora…o que é que se passa? Até que fomos no autocarro e pronto, não nos disseram nada, mas é um episódio de que eu não me esqueci. E outro foi um dia dois amigos da minha colega que vinham de Lisboa – eu sou uma fala-barato, depois nunca mais me calo – dois amigos dela que vinham de Lisboa, vinham de uma reunião, eles eram do Sindicato dos Empregados de Escritório, salvo erro, portanto, eles estavam um pouco envolvidos com a política. E então convidaram-nos para irmos jantar com eles a Peniche. E nós fomos. Uma noite de chuva e vento…e onde é que eles quiseram ir jantar? A um restaurantezinho – ainda lá ia dar ao sítio – que ficava mesmo ao pé do Forte e tinha um gira-discos em que as pessoas podiam pôr discos, à escolha. E eles puseram dois discos, mas acho que eram do Zé Afonso, uma coisa assim…eu tive tanto medo, tanto medo, eu só pensava: se chega aqui a polícia, vamos todos dentro! Não aconteceu nada, mas lembro-me perfeitamente dessa sensação de medo do que pudesse acontecer, porque eles eram atrevidos.