title: Estado velho (Protesto) singer: Francisco Fanhais author: José Carlos Ary dos Santos from: Fernando Pais type: canção de Coimbra "Palhaço lacrimogéneo" Ai não há dúvida vocês existem, vocês persistem vocês existem com grémios e tribunais medidas de segurança e capitais plenários, mercenários, festivais grades torturas verbenas cativeiros de longas penas com vistas para o mar para matar para matar {soc} Palhaço lacrimogéneo capacete de aço palhaço lacrimogéneo capacete de aço {eoc} Vocês existem, baionetas e chá com bolos cooperativas, clubes de mães concursos de gatos e cães cães de luxo para lamber cães polícias polícias cães para morder barracas de lata para viver trapos suor e lodo amáveis conversas de casaca e sobre as nossas cabeças a matraca a matraca a matraca... [Refrão] Vocês existem bordados a ponto cruz fazendo a guerra sugando o povo sorvendo a luz com Estoris, cocktails, recepções whisky, cascatas e rallies trapeiras e esconsos saguões discursos, salmão, lagosta pão duro, desespero e crosta e sorrisos de hospedeiras e assassínios de ceifeiras [Refrão] Ai não há dúvida continuam ainda a existir até ao raio que há-de partir até ao raio que os há-de partir htmlnota: história deste Protesto Para o caso de ter interesse a sua publicação, envio uma "cantiga de protesto". Escrevo-a de memória, pode eventualmente faltar um ou outro verso.

A crise estudantil e de acentuada contestação ao regime vigente culmina em Coimbra com a greve aos exames no ano lectivo de 1968/69. A partir da visita do então Presidente Américo Tomás à inauguração do edifício das Matemáticas (17 de Abril, se não erro), sessão em que consegui então estar presente, sendo presidente da Associação o actual deputado Alberto Martins, meu colega de curso nesse ano, as coisas complicaram-se. O presidente da Associação Académica pediu a palavra, que lhe foi recusada pelo Almirante. Depois, já no exterior da sala, nos corredores do novo edifício, houve vaias e recordo-me de um outro colega nosso, africano, lhe ter chamado à sua passagem sepulcro caiado (o Almirante vestia de branco). Isto para além de outros mimos. A polícia de choque não interveio logo ali, o que teria tido consequências muito graves, talvez pelo facto do Ministro da Justiça de então, prof. da Faculdade de Direito de Coimbra Mário Júlio de Almeida e Costa), estar ali presente e ter evitado que tal acontecesse. Esta foi pelo menos a versão que correu entre os estudantes.

Uma das formas de mobilização dos estudantes passava pelo convívio em que participavam alguns dos cantores de protesto, como foi o caso de Adriano ou de José Afonso. Como diz um poeta espanhol, a poesia é uma arma carregada de futuro e os versos eram então uma das armas possíveis de combate.

A par das canções do Adriano ou do Zeca, hoje conhecidas porque delas existem registos gravados, outras eram cantadas, algumas demasiado "fortes" para poderem ser sequer gravadas.

Dos versos que escrevo a seguir conheci duas versões musicais: uma cujo autor ignoro e ouvi pela primeira vez em 1970, por um dos "trovadores" anónimos que na época apareciam e de que não existem gravações em disco e uma outra que ouvi cantar numa sessão com o então Padre Francisco Fanhais , alguns anos depois. Suponho também que Fanhais nunca chegou a gravá-la em disco (em CD muito menos, como é óbvio: ninguém sabia o que isso era).

Ouvi várias opiniões sobre o autor destes versos, que não sei identificar. Em qualquer dos casos, o estilo musical das versões que conheci não tinha raízes de Coimbra. Chamemos-lhe apenas canção de protesto.

um abraço. Fernando Pais